Por Juliana Oliveira
RP1 Comunicação
Obrigatoriedade de declarar o planejamento tributário é controversa
O Conselho Federal de Contabilidade (CFC) recebeu a 15ª edição do projeto Quintas do Saber, realizado pela Academia Brasileira de Ciências Contábeis (Abracicon), em parceria com o CFC e a Fundação Brasileira de Contabilidade (FBC). O tema foi o Artigo 7º da Medida Provisória (MP) 685/2015.
Editada em julho deste ano, a MP 685 busca reduzir os litígios. Nos seus primeiros parágrafos, traz o Programa de Redução de Litígios (Prorelit), uma proposta de acordo, que permite ao contribuinte abater seus débitos, em litígio judicial ou administrativo, com créditos de prejuízos fiscais e de base negativa de cálculo da Contribuição Social sobre Lucro Líquido (CSLL), desde que desista do contencioso. Assim, a MP trata dos litígios passados, e, segundo a exposição de motivos encaminhada ao Congresso, tem por objetivo evitar litígios futuros, a partir da obrigatoriedade imposta às empresas de apresentar, todo ano, declaração sobre seus planejamentos tributários, por meio da comunicação de informações sobre operações relevantes.
A declaração ainda não tem uma sigla definida. Alguns a denominam de Declaração de Informações de Operações Relevantes (Dior), outros de Declaração de Planejamento Tributário (Deplat). Esta declaração tem gerado muitas polêmicas na classe contábil e jurídica. Segundo os críticos, ela traz uma série de conceitos vagos e imprecisos, impõe obrigatoriedade de uma função que não é do contribuinte e exige que todo planejamento tributário receba prévio aval do governo.
A vice-presidente Técnica do CFC e mediadora do debate do Quintas do Saber, Verônica Souto Maior, iniciou o evento fazendo uma contextualização sobre o tema, para que os participantes pudessem acompanhar os principais pontos do debate. Ela apresentou as distintas visões do mercado e do fisco sobre os objetivos do planejamento tributário. Destacou que, “para o mercado o planejamento tributário é um instrumento legal e legítimo, que tem por objetivo evitar a incidência, reduzir o montante ou postergar o pagamento de tributos”. Acrescentou que “o mercado entende que a redução da carga tributária é uma medida que visa a otimização dos negócios da empresa”.
Como contraponto, Verônica ressaltou que o fisco defende como premissa que “todo planejamento tributário deve ter o intuito de otimizar os negócios da empresa, ou seja, que em todo planejamento tributário deve estar sempre presente o propósito negocial. A Receita Federal do Brasil entende que o planejamento tributário não deve visar, exclusivamente, à redução de impostos”.
A doutora em Economia e Finanças e mestre em Direito Econômico, Cristiane Coelho, defendeu que o artigo 7º da MP 685/15 busca reduzir litígios, mas que traz, em seu texto, termos vagos. Para ela, o artigo 12 da MP pode ainda ferir a presunção de inocência do contribuinte ao impor multa caso ele não entregue a declaração. “Visto que o objetivo é apenas garantir segurança jurídica, por que não deixar que a declaração seja optativa? A Receita Federal deve permitir que o contribuinte entregue a declaração numa demonstração de boa fé”, defendeu.
A MP já recebeu diversas emendas na Câmara, segundo o consultor legislativo de Direito Tributário e Tributação da Câmara dos Deputados, Jules Pereira Queiroz e Silva. Entre elas, está a que propõe que a declaração seja facultativa. Outra define que a multa de 150% sobre o valor do tributo omitido, que hoje consta da MP, seja aplicado apenas para os casos em que a legislação já identifica como planejamento tributário agressivo.
O rigor da multa, além da pertinência da exigência da declaração e a insegurança jurídica decorrente dela, foram salientados pelo consultor jurídico e ex-secretário da Receita Federal do Brasil, Everardo Maciel. “A obrigatoriedade de entregar a declaração é desnecessária. Todas as informações requeridas podem ser conseguidas pela Receita Federal, sem a declaração”, afirmou. Ele disse ainda que a entrega da declaração não trará segurança jurídica. “Os conceitos presentes no artigo 7º são vagos e subjetivos. O que são razões extratributárias relevantes? O que é forma usual?” questionou o consultor.
O coordenador-geral de Tributação da Receita Federal do Brasil, Fernando Mombelli, afirmou que a medida carece de regulamentação, que está sendo produzida pela Receita e pela Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional. “O texto ainda não tem regulamentação, que está sendo preparada, e todas estas subjetividades serão esclarecidas”, afirmou.
O caráter plural do debate é a marca do projeto Quintas do Saber, afirmou a presidente da Abracicon, Maria Clara Cavalcante Bugarim. “O tema é extremamente relevante para a classe contábil e pudemos ouvir as várias opiniões sobre o tema para que possamos tirar nossas próprias conclusões”, afirmou. Ela também lembrou que Mombelli esteve na primeira edição do projeto. “Procuramos trazer sempre especialistas qualificados sobre os temas que estamos abordando, e este é o principal motivo do sucesso do Quintas do Saber”, afirmou Maria Clara.
O presidente do CFC, José Martonio Alves Coelho, agradeceu a oportunidade de receber o evento. “Para nós é uma honra receber debate de tão alta qualidade, com participações qualificadas e que estão na ordem do dia da classe”.
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